Saflate: “problema da UERJ reflete fracasso da sociedade brasileira”

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Em sua coluna na Folha de São Paulo, o professor Vladimir Safatle, da Universidade de São Paulo, fala sobre a crise que a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) enfrenta, e faz uma crítica sobre a sua relação com as desigualdades sociais e as prioridades dos governos.

O texto foi publicado no dia 20/01/2017.


A Universidade Estadual do Rio de Janeiro, uma das mais importantes universidades do país, com cinco campi e 35 mil alunos, está ameaçada de fechar por falta de repasse de verbas. O início de suas aulas foram adiadas devido à ausência absoluta de condições.

Já no ano passado, vimos a cena desesperada de alunos e professores arrecadando cestas básicas para oferecer a funcionários com meses sem receber salários.

Longe de ser um caso isolado, a UERJ é apenas o exemplo mais dramático da situação da educação brasileira pública. Um país que leva universidades ao ponto de fechamento, sem causar nenhuma indignação social efetiva, é um país arruinado. Por isso, há de se dizer que o problema da UERJ não é apenas de seus professores e alunos. Ele é a expressão crua do fracasso puro e simples da sociedade brasileira.

Há dias, um ministro do Supremo Tribunal Federal, o sr. Roberto Barroso, achou por bem tecer considerações sobre o problema afirmando que deveríamos repensar o sistema público de ensino, de preferência apelando a um modelo de financiamento privado. No que ele expressa a opinião de alguns, para quem a educação deve aceitar não ser mais uma prioridade efetiva dos Estados, pois dinheiro não há.

É impossível não ver certa ironia em um representante do Poder Judiciário – o mesmo poder que recebeu, no meio da crise econômica que assola o país, aumento de seus salários monárquicos (causando um impacto de R$ 4,7 bilhões a menos só em 2017) -, falar que há de se aceitar que o Estado não tenha R$ 1,1 bilhão para garantir o orçamento de uma das nossas mais importantes universidades.

Alguém poderia começar por tentar explicar o que era, de fato, mais prioritário ao país: aumentar salários de desembargadores, juízes e afins ou garantir o funcionamento de nosso sistema público de ensino, levando a União a financiar universidades públicas (mesmo que estaduais) combalidas. Como se vê, o problema não é a falta de dinheiro. O problema é: para quem o Estado é, de fato, um Estado mínimo.

Mas tenhamos uma visão de conjunto. No mesmo momento em que o sistema de pesquisa e ensino brasileiro é desmontado, recebemos, graças a Oxfam, a notícia de que as oito maiores fortunas do mundo equivalem aos rendimentos de, simplesmente, metade da população mais pobre do planeta. Alguém poderia se perguntar o que esses dois fatos têm em comum. Eu diria: há uma relação profunda de causa e efeito.

Para que possamos chegar à situação repugnante de oito pessoas terem uma riqueza equivalente ao trabalho da metade mais pobre da população do planeta é necessário, ao menos, dois fenômenos.

Primeiro, uma desqualificação do trabalho manual e seus frutos, com claros interesses de espoliação. Não é apenas a concentração imoral de renda que choca, mas o caráter fictício do valor, que faz do trabalho manual, fundamental para a reprodução material da sociedade global, algo pago apenas no limite da sobrevivência da mão de obra.

Para que essas pessoas sejam ricas, é necessário que o trabalho que está na base da produção seja brutalmente desvalorizado.

Isso pode chegar ao extremo. Lembrem como um dos oito afortunados é dono da Zara, a mesma empresa denunciada, inclusive no Brasil, por se aproveitar de trabalho escravo. Assim se fazem as fortunas.

Um comentarista afirmou, com um tom de condescendência, que Bill Gates (outro afortunado) usa sua fortuna para programas de eletrificação na África. Bem, mas os africanos não precisam da filantropia de Bill, eles precisam apenas de preço justo para seus produtos.

O segundo fenômeno em questão é a demissão do Estado de sua responsabilidade social. Warren Buffett (outro afortunado) chegou a escrever artigos anos atrás dizendo que milionários como ele deveriam pagar mais impostos e que não conseguia entender por que era tão bem tratado pelo fisco do seu país.

Bem, Warren, enquanto pessoas como você são agraciadas, principalmente no Brasil, com o sorriso cúmplice do fisco e dos governos, universidades públicas são fechadas por falta de verba. Mas há sempre aqueles que se identificam com o agressor e julgam que nada disso vale uma batida de panela.

Reaprendendo a ler notícias

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Por Jorge Alves de Lima

A revista Veja e o jornal O Estado de São Paulo, também conhecido como Estadão, foram dois dos noticiosos que fizeram parte do final da minha infância e do começo da minha adolescência, graças a uma prima que trabalhava em um consultório ginecológico e os trazia para mim. Por obra divina, o médico não assinava a Contigo, uma revista de fofocas, e nem existia a famigerada Caras – publicações mais comumente encontradas nas salas de espera e que certamente teriam castigado minha formação enquanto leitor de notícias.

Depois, cheguei a ser leitor regular da Folha da Tarde e do Jornal da Tarde – conhecidos por terem um ar mais descontraído. Também assinei a revista IstoÉ, de notícias, além da Playboy – segundo amigos e inimigos, fui um dos poucos leitores das matérias escritas da revista, pois muitos se interessavam apenas pelos ensaios fotográficos. Há controvérsias. Verdade é que eu gostava de revistas, por isso, fui leitor regular de Exame, Casa Cláudia, Mundo Estranho, Superinteressante, Caros Amigos, Cult (dessa, tenho muita saudade), Bravo, Seleções, Projeto, Urbs, Época e Você S/A.

Apesar de ainda acompanhar com alguma regularidade diversos meios, confesso que, dentre os veículos escritos, acostumei-me de vez ao padrão da Folha, que procura atrelar comentaristas/colunistas aos assuntos, formando o binômio notícia e opinião, que, comigo, tem funcionado bem. No formato revista, porém, as publicações da Folha beiram à futilidade: a revista que circula aos domingos até melhorou bastante, mas aquela Serafina (mensal) é de doer…

Sem nunca ter sido assinante, lia frequentemente e gostava muito do finado Jornal do Brasil (e sua ótima revista dominical) e ainda leio, quando posso, O Globo. Porém, sendo revisor de texto, o tempo para ler periódicos foi ficando escasso, ao passo que ficou mais fácil seguir as notícias pelo rádio e, claro, pela internet. Ainda assim, atualmente, sou leitor-assinante da Folha. De uns tempos para cá, tenho ouvido muito sobre a questão de a mídia estar vendida para este ou para aquele lado; daí que resolvi experimentar: assinei, mesmo sem conhecer, a revista CartaCapital.

Ocorre que, por engano, junto com a terceira remessa – que acabou de chegar aqui em casa – veio também um exemplar da revista Veja, devidamente acompanhado da Veja em São Paulo (a Vejinha).  Uns vinte anos atrás, isto seria o mesmo que acertar na loteria: ter duas revistas para ler no mesmo final de semana! Mas não desta vez: não me interessei nem mesmo em folhear a Veja, ao passo que esta terceira entrega da CartaCapital me alcançou sem que eu tivesse lido nenhum dos exemplares já recebidos. Em verdade, na semana passada, com a chegada do segundo exemplar, lembrei-me de tirar o primeiro da embalagem para, enfim, folheá-lo.

Com a revista em mãos, estranhei tudo: a diagramação, a distribuição das matérias, os anúncios e, claro, o foco. A sensação de estranheza reside, principalmente, na abordagem: parece-me que vou me deparar com informações desencontradas, pois, evidentemente, quando uma revista semanal fica pronta, muitos de seus assuntos já foram tratados e, por esse prisma, boa parte da construção da minha opinião sobre determinado tema já se deu a partir dos outros meios de comunicação.

Percebo-me, portanto, diante de um exercício de leitura, pelo qual eu preciso reaprender a ler o que é novo, o que é diferente. Não tive essa estranheza com a revista Caros Amigos, que, se me recordo bem, se apresentava também como fora do circuito tradicional. Claro que eram outros tempos: sendo jovem, a novidade me chegava sem muitas barreiras ao coração e dali se irradiava para o corpo e para o espírito. Aos 43 anos, vejo que fui ficando um pouquinho reacionário e ligeiramente refratário à novidade – além de reclamar da “juventude transviada” com os mesmos velhos argumentos que eu ouvira na minha mocidade.

Penso que essa troca de papéis entre jovens e nem tão jovens seja cíclica e sirva para alimentar o movimento do mundo: não fossem os jovens acreditarem nas revoluções, no futuro e nas utopias e talvez ainda estivéssemos morando em cavernas. Por outro lado, não fossem os mais experientes corrigindo os rumos, propiciando os meios e garantido os resultados, talvez também ainda estivéssemos no tempo das cavernas – mas já sem cavernas para morar.

Por enquanto, percebo que fiz com a CartaCapital aquilo que eu fizera com a Wikipédia, com o Firefox, com o ReclameAqui, com a própria Folha e com outras organizações: assinei ou investi (não muito, claro) para patrociná-los enquanto alternativa, pois penso ser positivo termos opções à disposição e sermos igualmente responsáveis por elas. Por não acreditar em notícia grátis, resisto o quanto posso ao conforto de buscar informações fáceis em páginas da internet supostamente gratuitas – e nem tenho mais idade para acreditar em total imparcialidade na produção de conteúdo: todos temos um ponto de vista para defender e o fazemos com maior ou menor parcialidade.

Daí que ler a revista CartaCapital venha a ser o meu exercício pessoal em busca de um novo olhar. Não sei muito sobre a revista, mas aposto que seja uma boa publicação, pois não chegou ontem ao mercado e tem em Mino Carta um publisher respeitável. A publicação tem muitos (e ferozes) críticos – aliás, foram as críticas que me contaram de sua existência. E parece-me que essas críticas também signifiquem que a revista não é um veículo invisível: sua mensagem chega aonde tem que chegar e deve incomodar alguns players do mercado e da política (sabe-se lá onde o “mercado” se distingue da “política” nesses tempos de conluios).

Penso ser esse o papel de uma publicação no formato de revista: reunir um grupo de leitores em torno de um ponto de vista. Acreditar na sua maneira de narrar o mundo. Vender uma alternativa de pensamento. Aliás, porque creio nisso, critico respeitosamente a existência de revistas como a Caras, mas as folheio sem compromisso e com ligeira diversão enquanto espero meu dentista me chamar.

Da minha parte, contudo, espero reaprender a ler textos diferentes do que eu venho lendo, sem esse sentimento tão forte de estranheza – e, com esse reaprendizado, quem sabe, recobrar um pouco da juventude que está me escapando velozmente com o passar do tempo. E também ainda espero uma revolução, em mim e no mundo – mas, agora, já torço para que seja mansinha e respeitosa. Uma revolução, como diria Drummond, “Que faça acordar os homens e adormecer as crianças”.

PNAE: Alimentação escolar de qualidade

alimentação%20escolar.jpgPor Josemeri Dattola

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), do Governo Federal, tem por objetivo atender às necessidades nutricionais dos alunos matriculados em escolas públicas, durante sua permanência na escola, desde a educação infantil (creches e pré-escolas), ensino fundamental e médio, escolas indígenas e filantrópicas.

Esse Programa, implantado em 1995, contribui imensamente com a qualidade de ensino no País, pois é de conhecimento de todos que o aluno bem alimentado possui melhor rendimento escolar, disposição para aprender e saúde. Alimentação de qualidade dentro do contexto escolar desperta hábitos alimentares saudáveis, melhorando a qualidade de vida dos educandos.

Sabemos que a Legislação Brasileira garante a todos os alunos o Direito de receber a alimentação no seu ambiente escolar. Desse modo, o PNAE não possui apenas a função de satisfazer as necessidades nutricionais dos alunos, enquanto permanecem na escola: ele vem ao encontro de Programa Social para concretizar o direito humano e universal à alimentação.

Portanto, para que o Programa tenha seu objetivo alcançado, a Secretaria Municipal de Educação, o gestor escolar e o Conselho de Alimentação Escolar (CAE), devem acompanhar, fiscalizar e aplicar devidamente os recursos do PNAE, já que é papel dos mesmos apontar as falhas existentes e os problemas encontrados, a fim de corrigi-los e fazer com que o Programa funcione cada vez melhor.

A garantia de uma alimentação saudável não se traduz unicamente no ato de ofertar frutas, hortaliças e outros alimentos nutritivos adequados. É importante que esses alimentos sejam manipulados por pessoas capacitadas e preparados conforme regem as normas para a produção de alimentos, garantindo assim o direito constitucional de uma alimentação saudável e segura.

O PNAE, além de fornecer uma parte dos nutrientes que o escolar necessita diariamente, também pode ser considerado um instrumento pedagógico. O nutricionista, cuja formação tem ligação com o campo educativo, pode, ou melhor, deve ter participação ativa nessas discussões, interagindo com a equipe escolar, propondo atividades com o objetivo de esclarecer a importância do PNAE e discutindo sua função na escola.

Rever o papel desse Programa no ambiente escolar é um importante passo para dar um novo sentido às atividades sobre temas mais específicos da nutrição, visando integrar as atividades promotoras de saúde na escola. O Programa não pode permanecer alheio às demais atividades pedagógicas desenvolvidas no ambiente escolar. Por meio de processos interativos, quando se compartilham diferentes estratégias desenvolvidas por professores, nutricionistas, merendeiras e demais funcionários da escola para o enfrentamento das rotinas ou das dificuldades cotidianas, constrói-se o ambiente. Nas áreas da educação e da saúde, muitos consideram o PNAE apenas na sua dimensão assistencial, pois a ele atribuem o único objetivo de suplementação alimentar por meio de lanches ou pequenas refeições no intervalo das atividades escolares. Porém, isso obscurece suas possibilidades educativas e dificulta as atividades que permitiriam a produção de novos conhecimentos significativos no espaço da escola.

Compreender e conhecer as ações do PNAE é de suma importância para que todos nós sejamos parceiros na gestão dos recursos, no entanto percebemos que a maioria dos professores e gestores estão despreparados para fiscalizar e detectar problemas na aplicabilidade. Portanto, o PNAE deve ser apresentado aos educadores, conselheiros e comunidade, para que todos tenham a oportunidade de adquirir esse conhecimento e sejam capazes de acompanhar de maneira eficaz a destinação dos recursos e verificar lá na escola a qualidade da alimentação escolar servida aos alunos. É dever de todo cidadão contribuir para a melhoria da aplicação dos recursos do PNAE, priorizando a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de práticas alimentares saudáveis dos alunos.