Regimes alimentares e questões agrárias

Reproduzido do site da Editora UNESP, publicado em 27 de fevereiro de 2017.


Pesquisador da Universidade de Cornell analisa as relações agroalimentares em escala global a partir do conceito de regime alimentar, que articula produção e consumo de alimentos com acúmulo de capital

capaEm 2009, existiam cerca de um bilhão de famintos ou subnutridos no mundo. Cerca de três quartos destas pessoas viviam na zona rural. Trata-se de uma crise alimentar que, desde o começo do milênio, gira em torno da política dominante das relações alimentares, de uma cadeia de interesses que, por meio da mercantilização, transforma as culturas agrícolas ao redor do mundo. Neste cenário, em Regimes alimentares e questões agrárias, que a Editora lança em coedição com a Editora da UFRGS, Philip McMichael articula estas e outras questões em uma interpretação das relações entre os problemas alimentares, as estruturas de produção e o consumo de alimentos na ordem capitalista global.

Para isso, McMichael utiliza o conceito de regime alimentar, instrumento analítico usado para demonstrar como a produção e o consumo de alimentos são direcionados para o acúmulo de capital. Faz isso comparando três períodos distintos: o imperial, dominado pela Inglaterra entre 1870 e 1930; o intensivo, centrado nos Estados Unidos entre 1950 e 1970; e o corporativo, comandado pelas corporações entre 1980 e 2000.

Trabalhando com o significado político das relações agroalimentares em escala global, descortina com perspectivas alternativas, em especial as baseadas na soberania alimentar, para propor soluções aos problemas gerados por estes regimes, principalmente a questão da fome como um fenômeno predominantemente rural. Como coloca o pesquisador Eduardo Paulon Girardi no prefácio dessa edição brasileira, Regimes alimentares e questões agrárias “permite que o leitor compreenda que o que chega ao seu prato (o que, quanto e com qual qualidade) não é exatamente fruto de sua própria escolha e muito menos da escolha dos agricultores, mas sim é determinado por projetos muito mais amplos que submetem países, povos, agricultores e consumidores às necessidades do processo incansável de acumulação do capital”.

Regimes alimentares e questões agrárias integra a série Estudos Camponeses e Mudança Agrária, resultado de uma parceria entre a Editora Unesp, o Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais, a Cátedra Unesco de Educação do Campo e Desenvolvimento Territorial, o Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Territorial na América Latina e Caribe (TerritoriAL), a Coleção Vozes do Campo, a Editora da UFRGS e a Série Estudos Rurais, ligada ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural.

Sobre o autor – Philip McMichael é professor do Departamento de Sociologia do Desenvolvimento da Cornell University e autor de Settlers and the Agrarian Question: Foundations of Capitalism in Colonial Australia (1984) e Development and Social Change: A Global Perspective (2012, 5.ed.).

Título: Regimes alimentares e questões agrárias
Autor:  Philip McMichael
Tradução: Sonia Midori
Revisão Técnica: Bernardo Mançano Fernandes e Sergio Scheider
Número de páginas: 256
Formato: 14 x 21 cm
Preço: R$ 48,00
ISBN: 978-85-393-0597-1

Martín Caparrós: entendendo a fome

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Por Guilherme Freitas, via Globo.com

Em uma aldeia no Níger, no oeste da África, o argentino Martín Caparrós conheceu Aisha, uma mulher de trinta e poucos anos que se alimentava com uma bola de farinha de milho “todos os dias que posso”. Jornalista experiente em dramas sociais, Caparrós perguntou a ela o que pediria a um mago se tivesse direito a um desejo. “Uma vaca”, respondeu Aisha, e quando Caparrós insistiu que poderia escolher qualquer coisa, ela disse: “Duas vacas. Com duas, sim, eu nunca mais teria fome”.

A história de Aisha é o ponto de partida do livro “A fome” (Bertrand Brasil), ambiciosa mescla de reportagem, ensaio e manifesto que Caparrós construiu ao longo de seis anos, em viagens por países da África (Níger, Sudão do Sul, Madagascar), da Ásia (Índia, Bangladesh) e da América (Argentina, EUA). Em cada lugar, encontrou diversas definições de “fome”. Por trás de todas, porém, uma mesma lógica: um planeta que produz alimento suficiente para toda a população, mas ainda assim deixa quase 1 bilhão de pessoas desnutridas, porque “alguns de nós concentramos recursos de tal modo que muitos ficam sem nada”, diz Caparrós.

imagemO senhor diz que decidiu fazer um livro sobre a fome “porque, se não fizesse, não me suportaria”. Como esse tema surgiu em sua vida?

Escrevo reportagens sobre temas sociais e políticos há muitos anos, em muitas partes do mundo, e sempre notei que, por trás de cada um dos problemas que analisava, havia um que se repetia como pano de fundo, quase invisível: o fato de que muitas pessoas não tinham comida suficiente. Olhando melhor, me parecia mais e mais vergonhoso: o fato de um mundo que produz comida suficiente para 12 bilhões de pessoas deixar quase 1 bilhão delas sem alimentos é uma grande canalhice. Por isso, decidi trazer o pano de fundo para o primeiro plano e escrever um livro sobre a fome. Mas era difícil, porque “a fome no mundo” é um clichê sobre o qual todos sabemos o que queremos saber — e que nunca é muito. Para não cair no lugar-comum, entendi que não existe “a fome”, e sim pessoas — centenas de milhões de pessoas — que passam fome, e eu queria escutar algumas delas.

Como o contato com essas pessoas mudou sua compreensão do drama da fome?

Não sei se mudou, eu diria que aprofundou, trouxe novos matizes. Seria uma bobagem pensar que todas as pessoas que passam fome pensam e sofrem da mesma maneira. Quis deixar de lado a facilidade de converter as pessoas em números, e encará-las como são. Muitas histórias me impressionaram: uma mulher em Daca, a capital de Bangladesh, me contou que, quando não tinha comida suficiente para os filhos, colocava uma panela com água no fogão, enchia de pedras ou galhos, e dizia para as crianças dormirem um pouco, que ela as acordaria quando o jantar estivesse pronto… Assim os garotos dormiam tranquilos. Não quis perguntar como ela fazia para o truque funcionar depois de duas, três, dez vezes. Acho que, ao menos nessa ocasião, preferi não saber.

“A fome tem muitas causas, mas a falta de comida não é uma delas”, o senhor escreve. E afirma que os casos mais graves de fome hoje “são causados pelas mãos de algum homem” ou por “uma decisão do poder”. Se o planeta produz alimento suficiente para todos, por que a fome persiste em tantos lugares?

getresourceÉ importante não confundir fome com hambruna (termo espanhol que significa uma crise humanitária de fome em larga escala). Hambruna é o estado de emergência em que algum acidente — guerras, tragédias, secas — faz com que muita gente não tenha acesso à comida. Isso, por sorte, já não é tão frequente. Por sua vez, a fome é a privação sistemática que sofrem 800 milhões de pessoas em todo o mundo que, dia após dia, não comem o suficiente. As razões são múltiplas, mas, sintetizando muito: porque alguns de nós concentramos os recursos do planeta de tal modo que muitos ficam sem nada. O planeta produz o suficiente para todos, só que o sistema econômico e comercial global está armado para prover os mais ricos — e deixar de lado os mais pobres.

Como avalia a ajuda humanitária aos países que enfrentam crises de fome?

Nas emergências, a ajuda humanitária é útil e eficiente. O problema é manter essa política assistencial nos processos de longo prazo: prover infraestrutura necessária — terras, irrigação, máquinas, sementes, depósitos, estradas — para que todos possam comer sem necessidade de receber bolsas da Europa ou dos EUA, sem depender das decisões de outros.

O livro narra o aumento de preços dos alimentos a partir da crise de 2008 e os conflitos por comida nos últimos anos em países como Egito, Burkina Faso e EUA. Que novos conflitos podem ocorrer por causa de alimentos?

Essa crise foi uma amostra do que pode acontecer quando os preços dos alimentos sobem bruscamente: a Primavera Árabe, conflitos violentos ou não violentos em cerca de 50 países. Diz-se que podem acontecer guerras por água ou comida, sem pensar que essa guerra existe desde sempre e está aqui o tempo todo. O que acontece agora é que um dos lados da guerra — os países ricos, os habitantes ricos dos países pobres — está vencendo com tanta vantagem que não precisa de operações militares. Para centenas de milhões de pessoas, isso que chamamos de paz é a aceitação da derrota. E elas pagam por essa derrota um preço muito alto: a desnutrição.


 

O escritor argentino esteve na III Bienal da Leitura e do Livro de Brasília, onde lançou seu livro “A Fome”. Acompanhe a entrevista, publicada no Youtube em 02/01/2017, para o programa Ponto de Vista.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fórum: “Da segurança alimentar à segurança dos alimentos”

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O Fórum Pensamento Estratégico (PENSES), da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), publicou na sua página do YouTube todos os vídeos com as palestras e mesas de debate do Fórum: “Da segurança alimentar à segurança dos alimentos: discutindo direitos, políticas e desafios“, ocorrido em Campinas no dia 19 de outubro de 2016. O evento teve como objetivo “traçar um paralelo entre a segurança alimentar e a segurança dos alimentos, no sentido de diferenciá-las e discutir as políticas e os desafios relacionados aos dois temas“.

 

 

 

 

II Encontro Nacional de Pesquisa em Segurança Alimentar e Nutricional

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Iniciará amanhã, dia 5 e vai até a próxima sexta-feira,  dia 7 de outubro, na Fiocruz do Distrito Federal, o II ENPSAN – Encontro Nacional de Pesquisa em Segurança Alimentar e Nutricional. O evento  tem como objetivo a  promoção do diálogo e da troca de experiências da pesquisa relacionada aos temas do Direito Humano à Alimentação Adequada e à Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. Além disso,  será discutida a proposta para instituição de  uma Rede Nacional de pesquisadores em Segurança Alimentar e Nutricional, para  propor formas e instrumentos de integração de pesquisadores e  estimular o intercâmbio e a interação com agências de fomento e outras instituições públicas relacionadas à área.

Para informações sobre a programação, acesse http://www.ceresan.net.br

CNPq lança chamada na área de Segurança Alimentar

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Pesquisas na área de Segurança Alimentar e Nutricional recebem apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) no valor total de R$ 4 milhões.

Está aberta a chamada pública nº 016/2016 na área de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) no âmbito do Programa de Desenvolvimento de Estratégias de Caráter Socioeducativas e Sociotécnicas em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional para os países da União das Nações Sul Americanas (UNASUL), com submissão de propostas até 19 de outubro.

Os projetos de pesquisa podem ser submetidos nas seguintes linhas de temáticas: Linha 1 – Direito Humano A Alimentação Adequada; Linha 2 – Antropologia Da Alimentação E Cultura Alimentar; Linha 3 – Politicas Públicas, Regulação, Monitoramento E Controle Social; Linha 4 – Sistemas Sustentáveis De Produção De Alimentos Saudáveis; Linha 5 – Gestão Pública Da Produção E O Abastecimento Alimentar; Linha 6 – Educação Alimentar E Nutricional (Ean); Linha 7 – Tecnologias Sociais E Inovação (Produção, Manipulação E Conservação De Alimentos Seguros E Saudáveis); Linha 8 – Qualidade Nutricional Dos Alimentos; Linha 9 – Controle E Prevenção De Agravos Decorrentes Da Má Alimentação.

Entre as ações previstas, está identificar e fomentar núcleos e grupos de ensino, pesquisa, extensão e apoiar a geração e difusão de conhecimento e tecnologias na área; integrar políticas públicas de modo a estimular a produção do conhecimento, as necessidades sociais e de gestão, produzindo o desenvolvimento social, segurança alimentar e nutricional, e inclusão social; alem da agricultura familiar, o abastecimento alimentar e compras institucionais até um consumo saudável.

As propostas devem ser encaminhadas ao CNPq exclusivamente via Internet, utilizando-se do Formulário de Propostas online, disponível na Plataforma Carlos Chagas.

Para saber mais acesse o edital da chamada.

Coordenação de Comunicação Social do CNPq

Agrotóxicos e maniqueísmo

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“A alternativa ao uso excessivo de fertilizantes não é um cultivo estritamente orgânico, mas manejos integrados, onde são aplicadas doses menores de agroquímicos, potencializados por maiores quantidades de materiais orgânicos e minerais, que propiciam condicionamentos positivos na biota do solo e altas vantagens monetárias aos agricultores”. Por Rui Daher, via Carta Capital.

 

Observatório do direito à alimentação e à nutrição: A nutrição dos povos não é um negócio

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“O Observatório do Direito à Alimentação e Nutrição 2015 – “A nutrição dos povos não é um negócio” – faz uma revisão do estado atual dos direitos humanos e do impacto das operações empresariais em comunidades de todo o mundo. Quais são as principais causas que explicam por que centenas de milhões de pessoas estão subnutridas, enquanto 500 milhões sofrem de obesidade? O que é necessário para garantir que a nutrição pertence aos povos e não às corporações?”

Texto originalmente publicado no blog Ideias na mesa, em 17/08/2016

Condições especiais para a produção de alimentos saudáveis

“O cultivo de alimentos saudáveis conta com uma importante participação da agricultura familiar no volume total do que é produzido no país. Segundo dados do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), existem 12 mil produtores de orgânicos no Brasil. Destes, 70% são agricultores familiares.” – Fonte: http://zip.net/bmtqTZ